• 30 August 2021
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TUMI Challenge: Fortaleza usa triciclos elétricos na coleta de recicláveis

Antônia Carliane Sousa de Araújo, 29 anos, é catadora desde a adolescência. Aos 17 anos, trocou a vida de empregada doméstica por um trabalho que lhe desse mais respeito, liberdade de horário e o sustento necessário para comer e morar. Carliane, assim como os cerca de 1 milhão de profissionais como ela que existem no Brasil, segundo estimativas do Movimento Nacional dos Catadores, são essenciais na cadeia de reciclagem: eles são responsáveis pela coleta de 90% de tudo o que é reciclado no país.

O trabalho destes profissionais consiste em andar pelas ruas das cidades recolhendo, em residências e comércios, materiais como papelão, vidro, garrafa PET, latas de alumínio e diversos outros tipos de resíduos que podem ser reutilizados. Como a separação doméstica ainda não é muito praticada, os catadores também costumam abrir os sacos de lixo comum, momentos antes de passar o caminhão da limpeza pública, em busca de resíduos que podem ser comercializados.

A carga recolhida, em geral, é acomodada em carroças – no estado do Ceará são feitas a partir de carcaça de geladeiras antigas – que podem carregar até 200 quilos. Os catadores puxam essas carroças enquanto percorrem diariamente dezenas de quilômetros, disputando espaço nas ruas com carros, ônibus, caminhões e motos.

Esses profissionais são também agentes ambientais, pois estão sempre em conversas informais educando a população sobre a importância da separação e a maneira correta de fazer a limpeza e o encaminhamento do material. “As pessoas sabem quase nada sobre separação, a gente vai sempre pela rua ensinando as pessoas”, diz Carliane. Mas, o grupo é ainda bastante marginalizado e trabalha em condições precárias, assim como a baixa remuneração. A renda média mensal de um catador no Brasil é de R$ R$ 561,93, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), quase a metade do salário mínimo no Brasil, que é R$ 1.110,00.

Carliane é uma dos 24 profissionais que estão, desde janeiro de 2021, pedalando um triciclo elétrico ao invés de empurrar a carroça. Essa troca é a principal ação do projeto Re-ciclo, que está cedendo estes veículos para associações de catadores na cidade de Fortaleza, capital do Ceará. O projeto, que é o resultado de uma premiação do TUMI e está sendo implementado pela Prefeitura de Fortaleza com apoio do CAF e GIZ, tem três objetivos: melhorar a qualidade de vida dos catadores, aumentar a coleta seletiva na cidade e testar os triciclos na ciclologística urbana.

O primeiro grande impacto do triciclo no cotidiano, segundo Carliane, é físico. “No final do dia eu não sinto mais dores nas pernas e nas costas. Chego em casa e não tenho mais aquele cansaço”, diz ela, que passou a fazer mais viagens de coleta por dia depois que aderiu ao triciclo. “Consigo às vezes fazer até três viagens em um único dia.”

A pandemia também afetou o setor de várias maneiras. Além de o volume de material destinado à reciclagem ter diminuído, o número de catadores, frente ao desemprego, também aumentou na cidade. “Minha sorte é que com o triciclo eu consigo ir mais longe, chegar em lugares distantes onde não há tanta concorrência.”

A segurança no trânsito também é um benefício sentido por Carliane, que pode fazer parte de seus trajetos usando as ciclovias da cidade. A capital cearense vem incentivando o uso da bicicleta como meio de transporte e desde 2013 aumentou em 464% a rede cicloviária na cidade, que hoje conta com 384 km de ciclovias e ciclofaixas. Segundo o Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP Brasil), Fortaleza é a capital brasileira onde as pessoas vivem mais próximas à infraestrutura cicloviária, com mais de 50% dos habitantes morando a menos de 300 metros de alguma ciclovia ou ciclofaixa.

“A maior parte dos meus trajetos ainda é por ruas e avenidas ao lado dos carros. O triciclo impõe mais respeito que a carroça, mas mesmo assim ainda tem um ou outro motorista que buzina, manda sair da frente”, diz ela. “Quando eu entro em uma ciclovia, aí é só alegria! Eu relaxo, me divirto e aproveito o vento batendo no rosto.”

O triciclo, segundo Carliane, trouxe outra grande mudança. Ela agora se sente vista e respeitada em seu trabalho. “Antes o povo fugia de mim na rua. Agora param para fazer selfie!”, diverte-se ela. “E muitos ainda pedem para eu parar, entram em casa e voltam com sacolas cheias de doação.”

O triciclo chama a atenção nas ruas e, por onde passa, atrai os olhares e a simpatia das pessoas, que passam a notar o catador que o conduz. Esses profissionais são estigmatizados como ladrões, sujos, dependentes de drogas e, na maioria das vezes, são invisíveis aos olhos da população. “Eu já estava acostumada e nem ligava para isso, mas agora que mudou eu tô achando ótimo.”

Além dos triciclos, Carliane também passou por uma série de treinamentos dados pelo Re-ciclo. Além das oficinas de adaptação ao veículo e noções de segurança viária, ela teve aulas de mecânica básica e manutenção do triciclo. Em breve, começam os treinamentos de saúde e segurança no trabalho e a capacitação para a realização de campanha porta a porta em sua região.

O projeto ainda está em fase de captação de dados para saber o impacto que o triciclo teve na coleta e, por consequência, na remuneração de Carliane, mas ela já aprovou a mudança. “Fazer a coleta ficou mais leve e eu me sinto mais respeitada!”

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